EM HOMENAGEM AO OUTUBRO ROSA...

( CRÔNICA ESCRITA E PUBLICADA EM 2010)
E quando ele olhou para mim e disse: “Você tem uma doença muito grave”, é claro que não acreditei. E ele ficou surpreso com minha reação. Talvez pensasse que eu iria chorar, entrar em completo desespero, mas não. Calmamente eu devolvi seu olhar e disse: “Tudo bem”. Talvez essa tenha sido a fórmula mágica: a descrença. Mas, com o tempo, os dias e as horas foram ficando intermináveis, a cada novo dia, uma nova surpresa, e nada agradável. Exames e mais exames foram direcionando o problema para a sala de cirurgia, depois a temível quimioterapia e o cara a cara com o outro lado da vida, um lado que eu nunca havia trilhado. O mundo da doença, da enfermidade, da dor e do desespero. Um túnel cor de cinza do qual você não vê a hora de achar a saída.
Cinco meses de tratamento se passaram; mudanças no corpo e na mente, adaptações ao irreversível, um novo jeito de viver, um novo jeito de sonhar, uma nova maneira de ver o mundo. Uma experiência e tanto de vida! A cada sessão quimioterápica eu nunca estaria sozinha, sempre havia novos pacientes. Alguns a primeira vez, outros reincidentes. E aquele líquido ali, passeando por minhas veias, e eu ali, ainda querendo acreditar em um pequeno grande engano. Engano meu, ele estava certo.
Amigos, parentes, com aquela grande força me levando por diante, fazendo-me acreditar que eu seria uma vencedora. Mas eu sabia, lá no fundo eu sabia que a vencedora não era eu, mas sim aquela parafernália de medicamentos que eu ingeria, e que ele, meu médico salvador me prescrevia. Muitas vezes eu pensava que minha viagem estaria próxima, organizava papéis, documentos, roupas e tudo o mais. Passado alguns dias até esquecia e a bagunça retornava e novamente eu pensava e fazia tudo de novo. Era um círculo vicioso.
Hoje assisti a entrevista do ator Reinaldo Gianechini na TV, que está acometido de um tipo raro de câncer. Ele transmite força e superação, porém, lá dentro de seu coração, deve estar tudo fragmentado. De agora em diante ele vai conviver, todos os dias e todas as horas, com a sensibilidade da vida e com a incerteza que essa doença dá. Ele mesmo afirmou que vive um dia de cada vez.
Assim também é o ex-Presidente Luis Inácio da Silva, o Lula. Mas eles são atores, políticos, gente do povo. Servem de modelo e de exemplo para muitos, embora ninguém queira esse modelo e exemplo. Superação? Sim, ela é muito necessária, mas não a leve como um troféu, ninguém quer levantar um troféu desses.
Hoje estou ainda aqui, passados dois anos e com exames periódicos. Ainda posso dizer: “Tudo bem”. Sei que devo muito à fé, a certeza que uma energia maior estaria cuidando de mim e que tudo ficaria bem ou não, mas como ficasse, seria sempre o melhor, o que estaria reservado para mim.
E, apesar dos pesares, a vida é bela e estou feliz, muito feliz por estar aqui compartilhando com vocês um pedaço de minha vida!
FATIMA MARDINI FRANDOLOSO
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